Campanha Gaúcha e As Fronteiras
do Vinho Brasileiro
Há umas tantas edições atrás,
utilizamos este espaço para apresentar um panorama da vitivinicultura
brasileira, com novas zonas de produção se desenvolvendo a cada dia. De fato, o
potencial do Brasil para a produção de bons vinhos é grande, temos um país de
dimensões continentais e portanto com grande variedade de solos e climas.
Ainda que esse potencial não seja
plenamente explorado, é inegável o interesse e abnegação de muitos e muitos
empreendedores deste mundo, a cada dia dedicando-se a alargar nossas fronteiras
vitivinícolas.
Neste processo, da busca pelo
novo, legados vão ficando pelo caminho. Conforme aprofunda-se o conhecimento
sobre regiões já tradicionais e segue-se adiante desbravando novas fronteiras,
mais compreende-se as vocações particulares de cada região e as particulares de
nossos muitos terroirs.
Parte crucial deste processo é o
reconhecimento oficial de novas zonas de produção, garantindo aos produtores
que ali investem a tranquilidade de que suas marcas regionais serão protegidas,
bem como garantindo ao consumidor a procedência dos produtos que estrão em suas
taças. Neste processo, o Brasil conta hoje com sete zonas de produção
demarcadas, sendo uma DO (Denominação de Origem) e seis IPs (Indicações de
Procedência). A inspiração é evidentemente o modelo Europeu, com as IPs
correspondendo aos Vinhos Regionais de Portugal, com áreas de produção mais
amplas e normas de produção mais abertas à criatividade e experimentação.
Em meio a pandemia que nos
assola, quando o inevitável isolamento e as muitas restrições ao deslocamento
levaram a um crescimento do consumo e do interesse do brasileiro por vinhos,
especialmente os locais, foi aprovada pelos órgão governamentais brasileiros a
criação de uma nova IP, a Campanha Gaúcha.
Ainda que a demarcação da IP só
ocorra oficialmente agora em 2020, é seguro afirmar que ela vem já com algum
atraso. Afinal não falamos aqui de uma região ainda debutante, com os primeiros
vinhedos experimentais plantados há pouco e um ou outro produtor pioneiro. A
Campanha tem tradições na produção de vinhos que remontam ao século XIX e,
especificamente na fase atual do vinho brasileiro, é justamente aqui que se
inicia a virada de nossa indústria em direção ao vinho fino, com a instalação
da multinacional norte americana Almadén na década de 1970.
Nos últimos anos foram 18 as
vinícolas que ali se instalaram, cultivando cerca de 1.600ha que fazem desta a
2ª mais importante região produtora do Brasil e com importante potencial de
crescimento no futuro próximo.
Localizada na fronteira sul do
país, no limite entre Brasil e Uruguai, a Campanha Gaúcha conta com importantes
vantagens competitivas. O clima é mais quente, seco e estável do que aquele da
Serra Gaúcha, nossa principal região. Desta forma, a maturação mesmo de castas
tintas de ciclo mais longo é mais confiável e estável, fato ainda favorecidos
pelos solos arenosos e de boa drenagem que aqui se encontram. Obtém-se aqui
ótimos resultados com castas bordalesas, bem como com a Tannat, mas não faltam
exemplos de bons vinhos feitos com castas menos comuns, como a Touriga
Nacional, a Alvarinho, a Riesling, a Petit Manseng, entre outras.
Outra importante vantagem da
Campanha Gaúcho é o relevo. A região é ampla e relativamente plana, com suaves
colinas, parte de um bioma que compreende partes do Brasil e do Uruguai, o
Pampa. Essa característica permite a mecanização dos vinhedos o que permite,
por sua vez, a produção de vinhos com menor custo. Há de se considerar que, por
não se tratar a vitivinicultura de uma atividade econômica de grande peso no
PIB brasileiro, a carga tributária sobre os vinhos, mesmo os aqui produzidos, é
significativamente alta. Logo, toda redução de custo acaba tendo um importante
impacto no preço final.
Em tempo, com o aumento da
produção local e maior compreensão da zona, a tendência é que tenhamos uma
divisão da Campanha em zonas menores, afinal falamos aqui de uma região que
tem, mais ou menos, metade da área de Portugal continental, portanto com
importantes variações de solo e clima.
Já não são poucos os vinhos de
alta qualidade produzidos na Campanha Gaúcha; também não são poucas as
vinícolas tradicionais, instaladas na Serra Gaúcha, que adquirem aqui as uvas
para alguns de seus melhores vinhos. O reconhecimento da IP permitirá maiores
investimentos da identidade regional, tornando a região reconhecida por seus muitos
méritos e facilitando o acesso do consumidor a vinhos cada vez melhores e mais
representativos da grande diversidade cultural que compõem o Brasil.
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