O sempre crescente interesse do consumidor por novos vinhos,
novas castas, novas origens e mais, já há muito tem sido o motor da expansão
das fronteiras do mundo do vinho. Especialmente nos últimos 30 ou 40 anos vimos
a emergência de novos e mais bem informados bebedores, interessados em melhor
conhecer a origem e história daquilo que têm no copo.
Assim, de forma natural, o storytelling de um vinho passou a
ser algo cada vez mais importante para a construção das marcas, o que acabou
por dar espaço a categorias antes virtualmente inexistentes, do ponto de vista
comercial, como os vinhos naturais, biodinâmicos e veganos, ou ainda vinhos de
países antes pouco presentes nas prateleiras ocidentais.
Nesta última categoria, vêm marcar seu espaço os vinhos do
Leste Europeu, de países que até o início dos anos 1990 estavam do lado de lá
da Cortina de Ferro, com governos comunistas ditatoriais sob influência direta
da então União Soviética. Dentro da lógica de controle centralizado do governo
Soviético, não tão diferente do que ocorreu em Portugal durante os anos de
Salazar, a produção da maioria destes países foi reorganizada, em sistema de
cooperativas, com foco no volume em detrimento da qualidade.
Desta forma, foi apenas a partir da queda do Muro de Berlim
e do fim da URSS é que a produção destes países voltou a se organizar, na
medida em que estas nações passaram a ter maior acesso aos mercados
internacionais, conquistando consumidores, em um primeiro momento, pelo
exotismo de seus vinhos, feitos com castas autóctones desconhecidas, ou em
regiões obscuras, ou ambos.
Posição privilegiada na conquista destes novos consumidores
acabou sendo ocupada pelo Croácia, parte da antiga Iugoslávia, fundamentalmente
por uma série de laços de sua história vitivinícola com a Itália, logo do outra
lado do Mar Adriático; a costa croata foi parte do território Veneziano no
passado e o interior do país é tradicional fornecedor de carvalho para os botti
tão utilizados na produção de vinhos do país da bota.
Hoje a Croácia é um destino turístico dos mais disputados,
com belezas naturais estonteantes e uma coleção de cidadezinhas pitorescas.
Neste cenário, o vinho do país também conquista mais adeptos a cada dia.
Podemos grosseiramente dividir o território nacional em dois; as áreas
costeiras, à oestes dos Alpes Dináricos, e a Croácia continental, com produção
de vinhos em zonas mais ao Nordeste. Oficialmente, desde 2018 temos 4 regiões
produtoras, duas no interior (Bregovita Hrvatska e Slavoniji i Podunavlje) e
duas no litoral (Istra i Kvarner e Dalmacija).
No interior temos já um importante laço com o restante do
mundo do vinho, já mencionado. Vem da Eslavônia o carvalho tão valorizado na
produção de barricas, especialmente tonéis e pipas. Aliás, não é incomum a
tradução equivocada de muitas publicações e sites para o português, que trocas
Eslavônia por Eslovênia, fato ao qual há de se estar sempre atento; recipientes
de carvalho são feitos com madeira da Eslavônia. A produção de vinhos aqui no
interior está concentrada em áreas mais próximas às fronteiras com Hungria e
Eslovênia, não sendo a região de maior destaque, ainda que produza vinhos
interessantes a partir de castas internacionais e locais. Talvez o maior
destaque aqui seja a casta branca Graševina, mais conhecida como Welschriesling ou
Riesling Itálico, apesar de não ter qualquer parentesco com a Riesling. O
destaque é mais pela ampla difusão dessa casta por outros países da região, bem
como pelo Brasil, e por tratar-se da casta mais cultivada em todo o país.
No mais, os vinhos do interior reúnem uma ampla coleção de castas
locais e internacionais, em uma variedade de estilos, em geral com maior foco
nos exemplares de boa relação custo/benefício.
Já nas zonas costeiras é que encontraremos a regiões de maior
destaque, bem como as castas mais reconhecidas internacionalmente, as castas
locais, que fique claro. Nessa parte do país encontraremos com maior frequência
uvas autóctones que são inclusive reconhecidas fora das fronteiras croatas.
Entre estas a mais popular é a tinta Crljenak Kaštelanski, também conhecida como
Tribidrag.
Certamente você já leu sobre essa casta croata e há uma grande
chance que você inclusive já tenha provado vinhos feitos com ela e não se
impressione se você não se recorda. O mais provável é que você a conheça por
outro nomes. Essa casta de nome quase impronunciável é nada mais nada menos que
a Zinfandel californiana, também cultivada na região italiana da Puglia, como
Primitivo.
Durante décadas considerada uma casta autóctone californiana,
pesquisas da UC Davis determinaram que era geneticamente a mesma Primitivo
italiana e mais alguns anos de pesquisa levaram a identificação de sua origem
croata. Aqui na Croácia a tinta que recebia maior atenção era a Plavac Mali,
que se chegou a suspeitar seria a Zinfandel mas hoje sabe-se ser um cruzamento
entre esta e a também autóctone Pošip. Apenas após essa descoberta é que essa
tinta, até então relegada ao segundo plano e cultivada em pequenas quantidades
no interior do país, voltou a crescer e vem entregando belos exemplares.
Ao longo da costa, da Ístria até o sul da Dalmácia, o litoral
recortado e cheio de ilhas entrega uma variedade de solos e microclimas, que
combinados com as diferentes tradições locais geram uma miríade de vinhos a
serem descobertos, desde brancos frescos e aromáticos, passando por tintos
cheios de caráter, até vinhos laranja, de longa maceração pelicular e maturados
não em carvalho mas em acácia. Ou seja, vinhos para todos os gostos, ocasiões e
gastronomias.
Dos mais interessantes países produtores que vem ganhando destaque
globalmente, merecedor da atenção de consumidores e escanções.
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