Uma França
de Contos de Fadas
Quase que
literalmente, aliás! Nesse edição vamos conhecer um pouco do Loire, região que
leva o apelido de “Jardim da França” por onde passei rapidamente durante o
Mundial de Sommeliers realizado em Paris no início de Fevereiro.
É um
conjunto de motivos que leva o Loire a ser assim conhecido; falamos de uma
região que, ao menos em parte, está bem próxima da capital, Paris, onde um
clima temperado, com chuvas na medida certa, propiciam uma paisagem verdejante
e atraente, ideal hoje para os turistas de fim de semana, mas em tempos
passados o refugio perfeito para a nobreza francesa.
Nobreza
essa, aliás, que fez do Loire uma região que tem ainda nos dias de hoje uma
grande concentração de castelos, posicionados ao longo dos mais de 1.000km do
rio homônimo, que tem sua nascente próxima ao centro geográfica da França e
desemboca no Atlântico, próximo a Nantes. Dessa combinação é que advém a
referência aos contos de fadas lá do começo, muito dos quais tem sim inspiração
na paisagem local.
Mas, fadas
e castelos a parte, viemos aqui falar dos vinhos, que fazem dessa região um
ponto de atenção para o escanção de onde quer que seja. E logo de início é
importante frisar que, ainda que falemos do Loire com uma única região, em
poucas regiões produtoras do mundo essa referência é tão incorreta.
Afinal, com
mais de 1.000km de rio correndo no sentido Leste-Oeste, uniformidade e
unicidade é o que menos encontraremos por essas bandas. Esqueça a relativa
simplicidade da Bourgogne, definida por duas uvas, ou Bordeaux, com pouco mais
de uma dezena delas, entre tintas e brancas, mas com estilos de vinhos muito
bem definidos. Não, o Loire não entra nesse jogo. Falamos aqui de uma colha de
retalhos, que em muito podemos comparar com Portugal, onde a cada poucos
quilômetros tudo muda, com novos solos, microclimas, tradições, estilos e
castas.
Antes mesmo
do detalhamento maior, das menores AOCs e suas subzonas, o Loire é usualmente
sub dividido em quatro macro regiões, começando pelo Pays Nantais, zona mais
próxima ao oceano e fortemente influenciada por ele, Anjou-Saumur, com a cidade
de Angers como seu epicentro urbano, Touraine, mais para o interior e, por fim,
o Loire Central, já mais próximo da Bourgogne do que das zonas costeiras do
próprio Loire.
Ao longo de
tantas centenas de quilômetros, cortados por um importante rio e por dezenas de
afluentes, forma-se uma impressionante variedade de microclimas, cada um com
características muito próprias de solo e com suas próprias tradições
vitivinícolas. Nesse cenário, ao longo da história, mais do que naturalmente
estabeleceu-se uma ampla variedade de cultivos, com uvas perfeitamente
adaptadas às condições de cada local.
Entre as
castas brancas, temos três de maior destaque; a Melon de Bourgogne, plantada no
litoral e utilizada nos vinhos de Muscadet, a Chenin Blanc, estrela de
denominações como Savennières, Quarts de Chaume, Vouvray e outras, além da
Sauvignon Blanc, que alcança sua máxima expressão nos vinhedos de Sancerre e
Pouilly-Fumé. Já pelas tintas, temos Cabernet Franc e Gamay em Anjou-Saumur e
Tourraine, e Pinot Noir no Loire Central.
Mas essa é
uma simplificação excessiva, mesmo injusta. Primeiramente não aborda a grande
variedade de estilos; brancos dos mais leves e delicados até os de grande corpo
em com potencial de guarda de décadas, rosés dos mais variados, tintos sutis
para o dia a dia e também de grande estrutura e complexidade, doces que vão de
colheitas tardias sutilmente adocicados até vinhos de podridão nobre entre os
mais complexos e densos, espumantes e frisantes, tudo isso a mais tudo aquilo
no meio disso tudo.
É confuso,
sim. E justamente por isso é apaixonante. Talvez mais do que qualquer região
francesa é quase que irresponsável tentar resumir o Loire, não uma região mas
sim uma congregação de regiões, onde além das castas já citadas encontramos
ainda Malbec/Côt, Chardonnay, Cabernet Sauvignon, Grolleau, Negrette e tantas,
tantas outras.
Estudar e
entender o Loire é certamente dever do bom Escanção, é próprio da natureza de
nossa profissão buscar esse entendimento preciso de todas as regiões
relevantes. Porém, mais que isso, é um grande prazer na realidade deparar-se
com tal variedade e oportunidade de aprendizado em uma só região. Bom, não só
uma, pelo menos quatro... Mas vocês já entenderam, não é?
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