domingo, 24 de janeiro de 2021

Valtellina Escanção

 

Valtelinna e a Sutileza do Nebbiolo Alpino

Muito já se disse, e ainda se diz, da enorme variedade de castas e regiões produtoras que encontramos na Itália. Em uma nação com mais de 300 espécies de uvas autóctones e mais de 400 regiões demarcadas, onde a variedade e a autenticidade são as palavras de ordem, é nada menos que um grande atestado de qualidade que uma casta específica venha a se destacar e ganhar espaço nas adegas mundo afora.

Nesta coleção de muitos nomes e muitas cores, é significativa a posição de grande destaque ocupada por um casta em particular, a Nebbiolo, nobre variedade do Piemonte tida por muitos, inclusive por este escriba, como incontestavelmente a maior entre as castas autóctones italianas, produzindo vinhos de elegância ímpar, potência, sutileza, complexidade e longevidade.

Sendo uma variedade exigente, são poucas as zonas demarcadas que tem a Nebbiolo como sua casta principal e destas as que são consideradas a máxima expressão do varietal são sem dúvida Barolo e Barbaresco, localizadas no Langhe, às margens do rio Tanaro, onde as colinas de orientação sul e o solo argilo-calcario oferecem as condições ideais para a perfeita maturação e pleno desenvolvimento de aromas e sabores.

No entanto, há ainda um outro Nebbiolo de alta classe a ser descoberto, um aliás que reúne um conjunto particular de características que o fazem absolutamente peculiar. Nos referimos aqui a Valtellina, a região demarcada mais ao norte da Itália, já na fronteira com a Suíça, em meio aos Alpes.

A Valtelinna reúne uma séria de características que a tornam única. O primeiro e talvez mais destacado ponto é que a casta aqui é a Nebbiolo, localmente chamada Chiavennasca e reconhecida por ser uma variedade de maturação difícil, mas que produz excelentes vinhos em meio aos Alpes, onde menos se espera que ela alcance os melhores resultados.

Tal feito é alcançado por uma combinação única de fatores. A região está localizada em um vale formado pelo rio Adda, correndo no sentido Leste-Oeste. O vale fica entre os montes alpinos Retiche, ao Norte, e Orobie, al Sul, que bloqueiam ventos frios que possam vir de ambas as direções. Além disso temos a breva, brisa quente originaria do lago di Como que sobra durante boa parte da primavera e por todo o verão, ajudando a manter temperaturas mais elevadas bem como evitar doenças fúngicas causadas pela humidade.

Outro ponto é a localização dos vinhedos, na margem Norte do rio, em encostas íngremes de orientação Sul, em patamares não muito distintos daqueles que encontramos no Douro. Assim, contam as videiras com a melhor exposição solar possível, além do acúmulo de calor pelas pedras das quais são feitos os patamares, calor este que será dissipado após o por do sol mantendo a temperatura um pouco mais alta e favorecendo a maturação dos bagos de Nebbiolo.

A particularidade desta paisagem cultivada desde há muitos séculos atingiu seu ápice no século XIX, com mais de 6.000ha, dos quais hoje restam cerca de 850ha espalhados por mais de 2.500 Km de terraços, naquela que é a maior área deste tipo em toda Itália. Esta riqueza histórica, geográfica e paisagística faz da Valtellina candidata ao status de patrimônio da humanidade pela UNESCO, outro ponto de semelhança com o Douro vinhateiro.

Aqui encontramos vinhos de 4 distintas denominações. A IGT Alpi Retiche, a DOC Valtellina e as duas de maior destaque e qualidade, as DOCGs Valtellina Superiore e Sforzato di Valtellina (Sfursat). Os vinhos de maior destaque e qualidade são os produzidos nas duas DOCGs, que contam com as subzonas de Maroggia (a menor, com apenas 24ha), Sassella (vinhos de grande elegância), Grumello (vinhos macios e longevos), Inferno (austeros e estruturados) e Valgella (os mais simples e diretos). Apenas uvas destas subzonas podem ser utilizadas para o Valtellina Superiore, mas uvas de toda a zona podem ser utilizadas na DOCG Sforzato di Valtellina.

O Sforzato (Sfursat no dialeto local) é provavelmente o produto de mais renome, devido a particularidades de sua produção, que estão de certa forma ligadas ao clima limítrofe da região. O Sforzato é feito com uvas de colheita o mais tardia possível, que posteriormente ainda passam por um período de appassimento de várias semanas antes da vinificação. Grosso modo, trata-se de processo semelhante ao de produção de Amarone della Valpolicella, que entrega um vinho com maior corpo, estrutura e álcool, além de aromas de frutos mais doces e maduros. São vinhos secos, de grande profundidade e complexidade, exemplos ímpares daquilo que os italianos chamam de vinhos de meditação.

Pois não bastassem todos estes aspectos, que já fazem da Valtellina uma zona única e destacada, encontramos aqui mais uma particularidade; trata-se de uma rara situação em que o vinho cruza as fronteiras nacionais. Devido a proximidade com a fronteira Suíça, país onde muitos dos produtores locais vivem, a normas permitem o engarrafamento em território suíço, recebendo então a menção Stagafassli.

O resumo é que não são poucos os aspectos distintivos desta zona não tão conhecida, sendo indiscutivelmente o principal deles a elevada qualidade. Motivos de sobra para despertar o interesse do escanção moderno.

Postagem em destaque

Enoturismo em Mendoza

Como parte de nossa nova parceria com a LATAM Travel Shopping Frei Caneca , teremos no mês de Novembro/2016 um imperdível tour por alguma...